A poesia da proteção animal está morta
Por Cynthia Gonçalves - Blog Animal
Chega a ser insana a responsabilidade que as pessoas depositam em nós protetores, como se resgatássemos por profissão e não por amor. Como se tivéssemos fundos financeiros infinitos para custear os resgates sem ter que tirar da nossa renda, a mesma renda que contamos as moedas para pagar as nossas contas de casa, comprar alimentos e sustentar todos os nossos animais. E quando dizemos que não temos condições de ajudar em algum caso as pessoas se acham no direito de ficarem bravas e indignadas.
Eu sempre achei que ser protetor de animal era um dom, mas o tempo e as experiências mudaram minha opinião. A poesia da proteção se perdeu quando tive que enfrentar e retirar animais de maus tratos e não apenas das ruas, quando tive que conviver com a falta de responsabilidade de pessoas que enxergam esses seres vivos como objetos, que os tratam como coisas, como se não precisassem de cuidados, como se não houvesse sentimentos nem dor neles.
A poesia se perdeu com o desrespeito e competitividade entre os protetores, quando a essência do resgatar deu lugar ao ego. Quando ao invés de compartilhar um vídeo pedindo ajuda para algum resgate deixou de ser importante e deu lugar para o julgamento e críticas do tipo “só quer aparecer”. Julgamento esse, vindo das mesmas pessoas que dizem proteger… contraditório, porém real.
A luta da causa animal sempre foi escrita há duras penas, mas com objetivos claros e fortes. Onde o dar as mãos era sinônimo de maiores chances para ajudar ainda mais animais e não de dividir os méritos. Aliás, não deveríamos falar em mérito e sim em amor e chance de um recomeço para os animais que necessitam.
Não há poesia na dor de um animal, nem na dor de um protetor ao resgatar. Não há mãos dadas o suficiente que nos proporcione maiores chances de salvar vidas, alguém sempre solta o problema no colo do outro.
Há um mês vivi a pior experiência de minha vida, eram 26 cães abandonados numa casa, sem água, nem comida, em meio a fezes, urina, dor e solidão. Cães morrendo em nossos braços, animais deficientes se arrastando e sendo pisoteados pelos outros em meio a todo aquele caos. Meus olhos não acreditavam no que viam, no vídeo eu implorava por socorro, por ajuda. No fim das contas tudo aquilo me mudou, não sei bem se isso é bom, mas não sou mais a mesma.
Um grupo de 20 pessoas, ao qual eu faço parte, conseguiu tirar cada animal daquela casa do horror, a maioria estão em lares temporários, mas essa união nem sempre acontece.
Pensando nisso tudo só posso chegar à conclusão de que a proteção animal não está em nós por dom e sim por senso de responsabilidade, compaixão e humanidade. Sentimentos esses que deveriam ser primordiais a qualquer ser humano, o que torna cada um de nós uma pessoa apta a mudar a vida de um animal abandonado. Basta querer.